quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Ode à Favela do Moinho

O Incêndio/ Agência Estado
Hoje cedo, o funcionamento dos trens metropolitanos que passam pelo centro de São Paulo foi prejudicado. Em época de festas de final de ano, num lugar como São Paulo, isso gera uma confusão no mínimo razoável. Por outro lado, moradores das imediações do centro - ou até de um pouco mais longe -, se depararam com uma enorme coluna de fumaça negra. Era a Favela do Moinho, varrida do mapa por um incêndio de causas ainda não determinadas. 


E não falamos de uma favela qualquer: ela era uma das poucas concentrações habitacionais de pobres dentro do núcleo urbano de São Paulo, uma cidade na qual o funcionamento do poder foi hábil em segregar essa população em uma longínqua periferia - ou mesmo, deixa-la difusa nas ruas. O Moinho, aliás, era um pólo histórico de resistência urbana, na qual os moradores lutavam contra uma particularmente incessante violência policial e o arbítrio de um (des)governo municipal, alinhado, de forma plena e cordial, com a especulação imobiliária - além de ser espaço de disputa relevantíssimo onde movimentos sociais e organizações humanitárias confrontavam essa lógica urbana absurda. Será que agora, seus desamparados moradores, conhecerão a "presença do Estado" em um sentido que não a violência policial constante? 


Em meio a esse pedante enredo de final de ano paulistano, a mesmice das milhões gastos com uma decoração natalina pífia que remente a invernos que desconhecemos, esse incêndio acende de vez um debate que está dormente: São Paulo morre lentamente, vítima de uma crise (bio)política cujos sintomas são uma poluição insuportável, a falta da mobilidade urbana, e de tragicomédia de sua administração atual, encabeçada por Gilberto Kassab - sendo que a Prefeitura, hoje, não passa de um leviatã manco ocupado por boçais, que fazem um desgoverno no sentido em que dizemos que um carro está desgovernado. 


O desafio posto, para além do aspecto eleitoral que se anuncia para o ano que vem, é enormíssimo. Não é o caso de vir aqui com a platitude de que precisamos de um bom governo: precisa-se na capital paulista da  produção de um anti-governo, pois é preciso desmontar o esquema de poder como ele está posto, desfazendo a forma Estado, ao passo em que se constrói organismos garantidores da autonomia das comunidades na organização dos espaços - para fazê-las funcionar, a partir daí, a despeito de qualquer gestão de Prefeitura, coisa que a gestão Erundina, ao menos, se dignou a sonhar. 


O grande entrave para isso, hoje, é o esquema sombrio e invisível da especulação imobiliária, que faz alugueis e valores de imóveis crescerem absurdamente na Pauliceia. Não é o caso de pensarmos em abstrações, mas sim na concretude da metrópole, seus modos de produção, reprodução e autoprodução. Isso requer uma luta e uma articulação profundamente complexas.







4 comentários:

  1. na cobertura da globo news do incêndio, toda e longa ao vivo... o titulo era incêndio destrói prédio abandonado no centro de são paulo... nenhuma palavra sobre a favela.... embora fosse visível q o fogo se espalhava muito além do prédio foco do noticiário... Só soube que trezentos (?) barracos haviam queimado lendo hj a FSP... globonews dizia q o prédio era invasão de catadores de lixo... e mostrava bombeiros resgatando 11 pessoas do teto do prédio... nenhuma vavela à vista...

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  2. Qualquer semelhança com as Diretas Já! não é mera coincidência.

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  3. Pois é, mas nem o prédio era abandonado, cerca de 200 famílias viviam ali, e muitos não conseguiram sair do prédio e suas mortes viraram silêncio, pq não permitem que ninguém documente nem divulgue nada.

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  4. Lu, o que os moradores sustentavam, até a manhã do dia 24, era de dois mortos. Parece-me que se confirmou mais uma. Até bem pouco, havia 30 pessoas com destino não determinado - que podem ser desaparecidos ou não -, mas até agora a Prefeitura não se manifestou com clareza. É possível, até pela dificuldade em identificar as pessoas, que o número de mortos seja maior, sobretudo no velho prédio (que constituía um dos blocos da comunidade) onde começou o incêndio.

    bjo

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